terça-feira, 15 de setembro de 2015

SHRI MUNI TARUN SAGAR JI


SHRI MUNI TARUN SAGAR JI



Shri Muni Tarun Sagar Ji nasceu no dia 26 de junho de 1967, na Vila Guhanchi, Distrito Damoh, em Madhya Pradesh, na Índia. Seu pai chamava-se Shri Pratap Chandra Jain Ji e sua mãe Smt. Shanti Bai Jain. Seu nome antes de tornar-se um muni, ou asceta Digambara, era Shri Pawam Kumar Jain. Cursou, apenas, o ensino fundamental, deixando a casa de seus pais com, apenas 14 anos, para torna-se um monge. Seu guia espiritual (guru) foi o Acharya Shri Pushpdant Sagar Ji Maharaj.

Shri Muni Tarun Sagar Ji é popularmente conhecido na comunidade jaina como o primeiro monge Digambara revolucionário (Revolutionary Saint = Santo Revolucionário). Ele mesmo disse em seu primeiro sermão proferido em Meerut (ou Mirat) : "Eu vim como um mensageiro revolucionário e não como um mensageiro da paz; vim com a espada da revolução e não com palavras de paz, porque a paz não é possível sem uma revolução nas atuais circunstâncias deste país e da sociedade". A cidade de Meerut, situada no estado de Uttar Pradesh, tem uma página de sublevação em sua história. Foi aí que se deu a Revolta dos Cipaios ou a Revolta Indiana de 1857. Alguns indianos consideram A revolta dos Cipaios o primeiro movimento de independência de seu país. Foi um período de levantes armados e muitas rebeliões na Índia setentrional e central contra a ocupação britânica. Talvez, por causa desse fato as palavras de Shri Muni Tarun Sagar Ji causaram grande impacto em seus ouvintes. Daí por diante, de todos os cantos da cidade, as pessoas passaram a frequentar sua preleções que eram um misto de cultura e moralidade. Até hoje, Shri Muni Tarun Sagar Ji atrai um séquito considerável de admiradores. Onde quer que vá, encontra um público enorme interessado em seus discursos e ensinamentos. Não é a toa que conseguiu superlotar, nada menos, do que o Red Ford*, o orgulho da capital da Índia, Delhi.

* Red Ford foi a residencia da dinastia dos imperadores que pertenceram ao Império Mughal da Índia por quase 200 anos. Ele está localizado no centro de Delhi e, hoje, abriga uma série de museus.




Seus pravanchans (prédicas) estimulam um verdadeiro encontro de comunidades que vêem de toda as parte do país para ouvi-lo. Com seu carisma ele consegue vencer as barreiras de casta, religião, sexo, idade, etc. Por ter uma forma eficaz, persuasiva de comunicar e um refinado senso de humor ele consegue cativar as plateias. Seu argumento é que Mahavira não é um exemplo digno à ser seguido somente pelos jainistas, mas um valor de confiança para todo ser humano. Para os jainistas e para muitos indianos Shri Muni Tarun Sagar Ji é "um santo que consegue tocar as cordas da guitarra, de inúmeros corações, que estão adormecidos  e fá-los despertar para as possibilidades da inteligência através de seus discursos revolucionários e suas flechas de fogo. É como um deus que nos ilumina e nos faz acordar. É um doutor que nos receita o caminho da conduta correta. Sua ampla visão não encarcera seus discursos em um número restrito de temas. Ele não fala e enaltece somente o jainismo e Mahavira; estende, sim, valores a outros personagens e escrituras sagradas que, também, trouxeram mensagens grandiosas e enobrecedoras como o Ramayana, Kabir, Patanjali, Gurunanak, Buda, Vivekananda, Osho, etc. Esta é a razão porque muitas pessoas de outros credos o admiram, respeitam e tem interesse em escutá-lo. Ele não fala apenas para os jainistas, fala para quem tem o coração aberto e sem preconceitos".




Por conseguir cativar as multidões, por ser tão popular, por conseguir exercer um fascínio incrível sobre todos, muitos indianos pensam que ele é um mago, um exorcista, um feiticeiro e um grande número deles o procura no intuito que distribua medalhões ou amuletos de sorte ou esconjuro. No entanto, a resposta de Shri Muni Tarun Sagar Ji para essas pessoas é: "Não conheço nenhum mago ou encantador; eu me subjuguei a mim mesmo, eis o feitiço."




Shri Muni Tarun Sagar Ji lançou um programa pioneiro e revolucionário que intitulou de "Ananda Yatra". Os monges jainas na Índia, por obedecerem rigorosamente os princípios de sua religião não costumam viajar para outros estados ou países. O "Ananda Yatra" desobriga-os a isso e esse programa se caracteriza por levar os monges a viajarem por todo e qualquer lugar, a pé, para pregarem a doutrina de Mahavira. Pelo que parece os indianos aprovaram essa prática e isso contribuiu, enormemente, para a popularidade e consagração de Shri Muni Tarun Sagar Ji. Sobre os discursos e pregações que que faz os ouvintes comentam: "O Santo Revolucionário Shri Muni Tarun Sagar Ji, quando ensina, seu discurso não sai da garganta, mas do seu coração melodioso. Ele fala com tal profundidade que os ouvintes mergulham no que diz e tornam-se inconscientes do mundo exterior - para cada um de nós, esses, são momentos preciosíssimos. Ele fala fluentemente e um fluxo radioso de sua intelectualidade, de seu conhecimento, de toda a sua sabedoria chega até nós como um fogo que nos desperta. Há muita profundidade, muita verdade, muita inovação e elevação em seus maravilhosos discursos. Quem o ouve não o faz uma única vez. Ele possui um modo especial de se expressar, e um estilo de linguagem que é pouco comum em monges jainistas. Shri Muni Tarun Sagar Ji é um santo de natureza alegre. Ele é uma pessoa muito feliz - expressa jovialidade a todo momento, tem um sorriso leve e seu rosto está sempre iluminado. Tem um senso de humor que cativa a todos. Poder-se-ia dizer que é um pintor e um escultor de palavras, pois dá colorido, forma e vida a elas. Com elas transmite as mensagens sempiternas deixadas por Mahavira para todo o  povo - sem distinção de castas, religião, idade, etc...". O programa pioneiro Ananda Yatra incentivou outros monges jainas a  percorrer outros estados e, até mesmo outros países para disseminar  a doutrina.




Shri Muni Tarun Sagar Ji possui um profundo conhecimento dos livros religiosos e um vasto conhecimento sobre outros temas relevantes, por isso a riqueza de seus discursos e o sucesso de sua literatura. Ele já escreveu vários livros e tudo quanto escreve é lido com grande interesse, não só pelos jainistas, mas por muitos indianos. Eis o que dizem: "A literatura de Shri Muni Tarun Sagar Ji é o espelho das experiências e emoções de cada um de nós; ele as analisa e nos ensina a arte de mudar a direção e as condições de nossa vida. São manuais de bem viver. Ele aborda a angústia e o sofrimento humano - como um raio x que nos revela a doença - mas, também, como um bom médico, nos ensina a curá-la."

Shri Muni Tarun Sagar Ji, também iniciou um movimento chamado Ahimsa Mahakumbh que visa impedir a exportação de carne e couro da Índia.





A popularidade e estima do povo indiano por Shri Muni Tarun Sagar Ji é tão grande que quando ele aparece em público para doar seus ensinamentos - realizar seus pravanchans - quase nunca é em templos ou casas de esmolas, mas em lugares  onde uma audiência de 5 a 10 mil pessoas possam caber. Além de pessoas comuns seu auditório, também, é constituído por oficiais do exército e grandes nomes da política. Independente da sua popularidade, a decisão de realizar seus "pravanchans" em ruas movimentadas e locais acessíveis a todos foi sua. Ele diz: "Eu quero libertar Mahavira dos templos; essa é a única razão porque parei de falar nos templos. Eu entrego meus discursos nas praças mais concorridas da cidade porque eu quero ver Mahavira circulando por todos os lugares. Meu único desejo é liberar Mahavira das mãos dos jainistas; a sua mensagem, a sua conduta, o seu ideal de vida devem ser visíveis para o mundo". E pelo que parece Shri Muni Tarun Sagar Ji está conseguindo realizar isso - espalhar o jainismo em massa sem fazer nenhum milagre. Seu objetivo é apenas difundir a filosofia do Senhor Mahavira "Viva e deixe viver". Afinal, todos têm direito a vida.


Shri Muni Tarun Sagar Ji







sábado, 5 de setembro de 2015

BUDISMO E JAINISMO - DIFERENÇAS E SIMILARIDADES - Por Jayaram V



BUDISMO E JAINISMO - DIFERENÇAS E SIMILARIDADES

Por Jayaram V



Jayaram V


Mahavira, provavelmente foi um contemporâneo do senhor Buda Gautama, fundador do budismo. Os textos budistas mencionam Mahavira como um ser iluminado. No entanto, alguns estudiosos acreditam que pertenciam a diferentes períodos e nunca tiveram contato um com o outro. De acordo com outras versões, Mahavira passou algum tempo na companhia de Gosala, o fundador da seita Ajivika* e do Buda Gautama, antes que , todos, se separassem por causa de graves divergências sobre questões doutrinárias. Tanto o budismo quanto o jainismo ganharam destaque num período de grande agitação intelectual e religiosa no subcontinente indiano. Na época, muitas tradições teístas e ateístas competiam entre si para ganhar popularidade e aceitação. O budismo e o jainismo tinham uma vantagem adicional, exatamente, por causa de Gautama e Mahavira. Ambos eram líderes carismáticos, tinham a capacidade de dialogar de forma convincente com os membros influentes da sociedade e, também, de organizar suas respectivas comunidades em torno dos ideais e da doutrina que pregavam.

* Ajivika - Foi uma seita ascética que surgiu na Índia no mesmo período em que aflorou o budismo e a reformulação do   jainismo por Mahavira; durou até o século XIV. A escola ou seita Ajivika ficou conhecida por ser uma doutrina partidária de um determinismo absoluto. Eles partiam do princípio de que não há livre-arbítrio - tudo o que aconteceu, tudo que está acontecendo e tudo quanto acontecerá é, inteiramente, predeterminado, por princípios cósmicos. A seita Ajivika considerava a doutrina do carma um logro. Sua metafísica incluía uma teoria de átomos igual a teoria da escola Vaisheshika, e ensinava que tudo é composto de átomos, que as qualidades surgem a partir de agregados de átomos, mas a agregação e natureza desses átomos são predeterminadas pelas forças cósmicas. A seita Ajivika era ateia e rejeitava a autoridade dos Vedas, mas acreditava que em cada ser vivo existia uma alma.

Os seguidores de ambas as religiões, muitas vezes, envolviam-se em acaloradas discussões sobre os aspectos mais delicados de suas crenças e ridicularizavam uns aos outros. Apesar disso, ambos os grupos, também, tinham as suas diferenças com a religião védica e os ideais que representava. Destes dois, o budismo era o mais severo em suas críticas para com esse outro adversário em comum. O fato de Gautama reprovar o ascetismo extremo e o ritualismo como meios para atingir a salvação indicam que o grupo budista, certamente, via o jainismo como uma tradição ortodoxa não muito diferente da religião védica. Tanto o budismo quanto o  jainismo procuraram atrair as pessoas das cidades para a conversão. Gautama e Mahavira, frequentemente, visitavam Benares, Pataliputra e outras cidades populares para organizar congregações, o que deve ter favorecido algumas competições entre as duas religiões para promover o seu patrocínio, popularidade e adesão.

A princípio, pode-se pensar, erroneamente que o jainismo e o budismo estão inter-relacionados ou que o jainismo é uma forma de budismo. Uma vez que, ambas as religiões, se originaram na Índia e ambas acreditam em carma, renascimento e libertação pode-se chegar a essa conclusão, que não é certa. Fora isso, nessas duas religiões as divindades - o Buda e Mahavira - são retratados de uma forma similar - sentados em posição de lótus e engajados em meditação. No entanto, apesar de o budismo e jainismo terem em comum partilhado uma história no subcontinente indiano, eles são diferentes em muitos aspectos. O budismo se espalhou pelo mundo, enquanto o jainismo permaneceu confinado a algumas regiões dentro da Índia. A seguir estão algumas das diferenças e semelhanças entre essas duas religiões.






OS FUNDADORES

O jainismo foi fundado e propagado por uma linhagem de vários Tirthankaras que vieram, em sua maioria, de famílias reais. Alguns dos Tirthankaras foram personalidades que constam nos manuais de História (Isto não quer dizer que os demais não existiram ou que não são personalidades históricas. Simplesmente, não se têm suficientes evidências históricas sobre eles a não ser as que constam nas Escrituras Sagradas). Mahavira foi o último e, talvez, o mais popular dos Tirthankaras. Os Tirthankaras são adorados nos templos e lugares religiosos não como deuses, mas como seres iluminados que se manifestam na Terra fazendo parte do destino humano. 

O budismo foi fundado por Sidarta Gautama, que se tornou o Buda após ter alcançado a iluminação. Como Mahavira, ele, também, veio de uma família real. No budismo não há a tradição dos Tirthankaras, nem linhagem de pregadores e profetas. Ele tem apenas um profeta - o Buda - e até mesmo os seus ensinamentos não precisam ser aceitos pelos budistas cegamente porque o  próprio Budha recomendou isso antes de seu Parinirvana*. Ele queria que seus seguidores fossem lâmpadas para si mesmos, uma ideia que ecoou vários séculos depois, através de Jiddu Krishnamurti, que pertenceu a Sociedade Teosófica, quando declarou que a religião era uma terra sem caminhos e que cada um tinha que encontrar seu próprio caminho**.  No entanto, os budistas acreditam nas várias encarnações e aparições de Buda e na existência dos vários Bodhisattvas, ou seres puros de compaixão, a quem eles adoram, pois confiam que deles recebem bençãos e ajuda. Alguns budistas creem que o Buda irá reencarnar novamente num futuro próximo a fim de revigorar os seus ensinamentos.


*Parinirvana - é um termo  usado no budismo para se referir a morte após o nirvana (ocorre após a morte do corpo de alguém que tenha atingido o nirvana durante sua vida). Isso implica a libertação do ciclo de renascimentos e dos carmas, bem como a dissolução dos skandhas.


**Jiddu Krishnamurti foi mal interpretado em suas declarações pelos teosofistas que estavam submissos e acostumados com a autoridade de mestres espirituais e a religião organizada. Os teosofistas repudiaram o fato de Krishnamurti ter seguido um caminho independente, pois acreditaram que ele traíra sua confiança e sua doutrina.




A EXISTÊNCIA DE DEUS E DA ALMA

Tanto o budismo quanto o jainismo são religiões ateístas. Eles negam a existência de Deus ou a Primeira Causa da Criação. Na verdade, o budismo pode ser considerado mais como uma religião agnóstica* do que ateia. A posição de Buda com respeito a Deus era bastante ambígua. Ele mantinha silêncio sobre a questão da existência de Deus e recusava-se a ser levado para qualquer conversa ou discussão sobre o assunto; declarava ser uma distração sem nenhum benefício aparente na libertação do homem.


* Agnóstico - é aquele que considera os fenômenos sobrenaturais inacessíveis à compreensão humana. A palavra deriva do termo grego "agnostos" que significa "desconhecido", "não cognoscível". Os agnósticos são seguidores da doutrina denominada "agnosticismo" que considera inútil discutir temas metafísicos, pois são realidades não atingíveis através do conhecimento. Para os agnósticos, a razão humana não possui capacidade de fundamentar racionalmente a existência de Deus.



O jainismo reconhece a presença de uma alma em cada ser animado e em objetos inanimados, incluindo os elementos do universo como a terra, a água, o vento, o fogo, o ar. Além disso o jainismo acredita nos tattvas ou princípios da natureza. 

Os budistas, também, acreditam nos tattvas de Prakriti (natureza objetiva, que é entendida como ilusória) mas não creem na existência de almas eternas e indestrutíveis. Eles, também, não aceitam que objetos inanimados têm vida ou individualidade. O budismo é distinguido pelo seu conceito de não-alma ou anatman. Declaram que um ser é um agregado de elementos e peças que chegam a existir por conta do carma e sua jornada continua até que mude a causa dos desejos e alcance o nirvana - ou um estado de não-ser - através de uma conduta correta e um correto viver. O conceito de um mundo cheio de inumeráveis almas - individuais ou almas grupo - ou almas escondidas em rochas, montanhas, rios, lagos, estrelas e planetas, conforme no jainismo, é insustentável no budismo.




A EXISTÊNCIA DE DIVINDADES

Ambas as religiões reconhecem a presença de deuses como sendo seres superiores, mas que, como nós, estão sujeitos a mudanças e evolução de acordo com o carma individual. Muitos desses deuses admitem os mesmos nomes usados no panteão hinduísta. Mas contrariamente as divindades hinduístas não são o tipo onipotente e onisciente. São, apenas, seres de outro plano ou mundo mais elevado do que o nosso, porém com poder e conhecimento limitados.


O jainismo acredita na existência de seres puros iluminados, chamados jinas ou kevalins que se manifestam na Terra, de tempos em tempos, para pregar a doutrina. O budismo, também, tem seu próprio grupo de seres iluminados conhecido como bodhisattvas; estes seres são qualificados para o nirvana, no entanto preferem adiá-lo para ajudar a humanidade a atingir a libertação. Os bodhisattvas  têm interesse  no bem-estar do mundo e trabalham para sua emancipação. Os kevalins  são adorados em templos e, também, nas residências. Nem todos os budistas adoram o Buda ou outros bodhisattvas ritualmente, exceto alguns pertencentes a seitas  tais como Mahayana e Vajrayana.




O CONCEITO DE CARMA

Tanto o budismo quanto o jainismo creem no conceito de carma como sendo uma força de ligação que é responsável pelo sofrimento dos seres. Eles reconhecem a universalidade do carma e seu efeito inevitável sobre os seres individuais que estão sujeitos ao ciclo de renascimentos. Mas diferem no que diz respeito à natureza do carma e como ele afeta os vários seres. De acordo com o jainismo o carma não é, meramente, um efeito ou resultado das ações de um ser, mas uma substância real que se apega a cada jiva , como uma impureza, enquanto ele executa ações no decorrer de sua existência sobre a terra. Esta substância cármica, que é um tipo de matéria sutil ou campo de energia, permanece ligado ao ser até que ele esteja, totalmente, purificado através da observância dos votos, de uma conduta pura e severas austeridades. No budismo, como no hinduísmo, o carma é um processo, uma consequência de ações, oriundas de desejos, que se agarram à personalidade de um ser como uma impressão de seu passado  e que determina o seu futuro. As boas ações conduzem a um bom carma e as más ações a um mau carma. Pode-se solucionar a questão do carma, seguindo os ensinamentos do Buda, as verdades consagradas no Dharma (doutrina) e o código de conduta prescrito para a Sangha (comunidade). O caminho óctuplo e as Quatro Nobres Verdades são os melhores meios para minimizar os efeitos negativos do carma, além de ser a via para a salvação.




Moksha jaina


Nirvana budista


O CONCEITO DE NIRVANA

O budismo e o jainismo acreditam no conceito de nirvana ou libertação dos seres que estão ligados ao carma. No entanto, há uma diferença entre eles em relação a quem alcança o nirvana (aqui trata-se do conceito de alma). De acordo com o jainismo as almas são entidades eternas que se envolvem nos fenômenos causais e ficam, por isso, sujeitas à leis do carma. Em seu estado liberado as almas são conscientes, puras e divinas. Mas em seu estado ligado tornam-se sujeitas ao ciclo de nascimentos e mortes. A morte é quando a alma se separa do corpo e o nascimento é sua entrada em um novo corpo físico, conforme determinada por suas ações anteriores. A alma pode libertar-se do sofrimento e limitações do corpo físico, levando uma vida pura e austera de acordo com os preceitos ensinados pelos Tirthankaras. Em alguns extremos, pode, também, ser conseguida pela destruição do próprio corpo através de austeridades e automortificações. Após a libertação, o jiva, ou alma, continua a permanecer como uma alma individual, porém no mais elevado estado de pureza e iluminação. No que se refere a alma, o conceito jaina de Nirvana, tem algumas semelhanças com as escolas Samkhya, Vaisheshika e algumas escolas dualistas do hinduísmo.


Já o budismo não acredita na existência de almas eternas. Por isso, aborda o tema da libertação puramente do ponto de vista físico e mental. O que se torna liberado no Nirvana é a personalidade individual que existia por conta das agregações de elementos (skandhas) e da consciência. Esta personalidade individual não é eterna, nem divina. Ela é, sim, uma entidade impermanente e instável, que está sujeita ao carma e ao ciclo de nascimentos e mortes. O nirvana é um estado indescritível no qual a personalidade individual torna-se livre a partir do processo do não-eu e, a partir daí, alcança uma espécie de quietude que é difícil de explicar.




MÉTODOS DE PROPAGAÇÃO

O desenvolvimento do budismo e do jainismo na Índia antiga coincidiu com o aparecimento dos centros urbanos, o que os favoreceu. A aplicação integral da ordem social e da estrutura de castas da religião védica ficou bastante difícil, senão impraticável, nessas regiões. Mahavira e Gautama aproveitaram a nova mentalidade criada pelos desafios da vida urbana, no que diz respeito a problemas comuns individuais e sociais - congestionamento populacional, doenças, morte, envelhecimento, etc. Ambos eram líderes carismáticos e grandes organizadores, com uma visão acurada do comportamento humano e questões existenciais. Eles praticavam o que pregavam e colocavam isso como exemplo a ser seguido. Eles usavam o contato pessoal, os debates e discussões  como o meio eficaz para levar as pessoas para o seu aprisco. Devido a serem descendentes de famílias nobres, foram capazes de manter relações cordiais com os membros influentes da sociedade, especialmente os reis e mercadores ricos que poderiam proporcionar-lhes o apoio logístico necessário para dar continuidade a propagação dos seus ensinamentos. Depois de alcançarem a iluminação, Mahavira e Gautama passaram a maior parte de suas vidas viajando de um lugar para outro pregando as suas respectivas doutrinas. Eles descansavam durante as monções e usavam o tempo de forma eficaz para treinar os monges e prepará-los para a libertação.


Enquanto os crentes da religião védica acreditavam que a espiritualidade era uma questão, totalmente, pessoal, ou privilégio de uns poucos escolhidos com base no seu nascimento (devido ao sistema de castas), Gautama e Mahavira, tomaram para si a responsabilidade de levar a religião para todas as pessoas, independentemente, da sua  condição social, política ou econômica; eles envidaram todos os esforços para se assegurarem de que as pessoas os ouviam e os entendiam. Gautama focou sua atenção sobre o estratos mais baixos da sociedade, que haviam sido rejeitados pela elite védica em razão de sua casta ou condição social. Ambos, Gautama e Mahavira mantiveram uma distinção clara entre os seguidores leigos e os monges, estabelecendo regras e conhecimentos distintos para cada uma dessas categorias de acordo com suas necessidades e aspirações. Eles usaram o Maharastri Prakrit, a linguagem das pessoas comuns, em vez do sânscrito, para a propagação das suas respectivas doutrinas. No mundo antigo, se a religião védica estava enredada na limitação da sua própria criação de castas, o budismo e o jainismo romperam todas as barreiras e estenderam a mão para uma parcela significativa da sociedade, a fim de ensinar-lhes os segredos da salvação que, até então, eram mantidos em segredo para eles. Jainismo e budismo abraçaram as pessoas comuns a quem a elite acreditava serem impróprias para a disciplina religiosa séria.




IGUALDADE SOCIAL, A MORAL E DIFERENÇAS DE GÊNERO

O budismo se opôs as quatro categorias da ordem social estabelecida pela sociedade védica que dividiu as pessoas em quatro castas, nomeadamente, em brâmanes, guerreiros, comerciantes e trabalhadores. Gautama admitiu pessoas de todas as classes da vida no budismo, embora é sabido que, por vezes, as castas superiores recebiam tratamento preferencial por parte dele devido a serem homens de virtude, de alto conhecimento e de superior intelecto. Nos estágios iniciais de suas pregações Gautama foi contra a ideia de admitir mulheres na vida monástica. Ele refletiu que a admissão delas levaria ao declínio da virtude e da boa conduta na Ordem Budista. No entanto, por causa de solicitações de seus seguidores mais próximos ele, relutantemente, deu início a haver mulheres nos mosteiros, mas formulando uma política de segregação com certas restrições e condições relativas a sua conduta  e a prática da doutrina.

O conceito de dividir as pessoas em classes e castas não era estranho ao jainismo. A Rishabhanatha, que foi o primeiro Tirthankara do jainismo, é creditado a formulação das divisões sociais baseadas na ocupação e virtude, que, posteriormente, se transformaram em um rígido sistema de castas pelos povos védicos. Os Tirthankaras, porém, não mostraram preferência por uma determinada classe. Eles admitiam pessoas de todas as camadas da sociedade de acordo com suas virtudes e preparação para os rigores da vida espiritual. Às vezes, eles se serviam da ajuda e do apoio consistente dos setores influentes da sociedade para propagar sua mensagem. O mesmo aconteceu com o budismo.




RITUAIS E MORALIDADE

Nos primeiros dias de sua popularidade o budismo se opunha aos ritos e rituais da religião védica e se atinha mais a conduta correta como meio para alcançar a libertação. Já o jainismo não tinha tais reservas. Brâmanes foram empregados em templos jainas como sacerdotes - ou oficiais de cerimônias - para realizar a adoração aos Tirthankaras. No entanto, rituais desempenham um papel mínimo no jainismo. O jainismo é uma religião austera em que a ênfase é dada mais as ações individuais, a contenção e a pureza interior para alcançar a libertação. Ambas as religiões negam a existência de Deus e descartam a possibilidade de uma intervenção divina ou um destino predeterminado. O que determina o destino de um ser na Terra é as  suas ações que emanam do exercício do seu livre arbítrio. Cada um é, totalmente, responsável por suas ações e tem que trabalhar para a sua própria salvação através de conhecimento religioso, da prática de virtudes e adesão rigorosa a um código de conduta  estabelecido.






TRANSMIGRAÇÃO

O jainismo acredita na transmigração das almas. O budismo não acredita na existência de almas, no entanto, também, crê na transmigração. O que transmigra de uma vida para outra não é a alma, mas o princípio causal da entidade ou ego que está sujeito às leis do carma e fica vinculado ao ciclo de nascimentos e mortes. Este princípio causal da entidade é uma agregação de vários componentes físicos e mentais que, juntos, constituem a personalidade individual, que está sujeita a experiência da dualidade, a dor e ao sofrimento. Ele continua a existir e passa por constante mudança até que cruza a ponte do samsara e alcança o nirvana ou um completo estado de de não-ser.




A NATUREZA DA EXISTÊNCIA E A REALIDADE DO SOFRIMENTO

Gautama pregou que a vida humana é caracterizada por uma grande miséria e sofrimento por causa dos desejos e apegos que permeiam a consciência de cada ser. A visão budista do mundo não é muito reconfortante - na verdade, é até negativa - a menos que se aprenda  a lidar com ele, ou nele viver, de forma adequada, cultivando a equanimidade para com os pares de opostos através de uma vida reta e de um conhecimentos adequado. Para os seres apanhados no ciclo vicioso do samsara ou fenômeno causador, o mundo não é um lugar ideal. Ele é preenchido com o mal sempre presente do sofrimento e do tormento. Oferece uma realidade em constante mudança, mudança em que os seres se envolvem por suas próprias ações, sonhos e desejos. A visão do mundo budista não é baseada em alguma revelação mística ou escritural. Ela tem suas raízes nas experiências mundanas da existência humana comum, no conhecimento da realidade atual e imediata derivada da observação pura, da contemplação de como o ser se apresenta no fluxo de eventos que passam. O homem está ligado ao ciclo de nascimentos e mortes e sujeito as aflições da vida por suas próprias ações e da natureza ilusória. Ele não pode escapar deste ciclo, exceto por meio de rigoroso auto-esforço e compromisso com o caminho óctuplo.


Para os jainistas o carma, não é um mero processo, mas uma dura realidade. É uma substância física da qual ninguém pode, realmente, escapar sem pagar o preço na forma de resgate, escravidão e sofrimento. É um fluido sutil, uma impureza que se apega a nós de acordo com nossas ações. A visão do mundo para os jainas é baseada em injunções das Escrituras estabelecidas pelos Tirthankaras através de seus ensinamentos. Há pouca margem em sua aplicação para a flexibilidade, para a liberdade pessoal e para a experimentação . As almas são reais e eternas. Em seu estado puro elas não estão sujeitas as leis da escravidão. Quando ainda não atingiram o estado puro  a realidade é diferente. Ficam presas ao mundo - que é uma armadilha que as atrai com os males da luxúria, da ganância, do orgulho, da raiva, da inveja. As almas são pura consciência. Elas existem, tanto, nos seres animados, como também podem estar em seres inanimados e, todas, estão sujeitas a lei do carma. 


Para os jainas o mundo é um vasto lugar sagrado, permeado com inúmeras almas capturadas em vários estágios de servidão e ilusão. Essas almas estão em todo e qualquer lugar como os átomos numa molécula. Por assim ser, o mundo é frágil demais; precisa ser tratado com o máximo cuidado e responsabilidade, porque as ações e reações de cada alma cria efeitos em cascata sobre outras almas. Mesmo atos simples como beber água ou comer devem ser executados com precisão de modo a não causar sofrimento as almas presentes na água, na comida, no ar, no espaço circunvizinho. Portanto, o jainismo sugere uma vida de não-violência e prescreve um código rigorosíssimo, intransigente e implacável de conduta para o indivíduo que queira alcançar a libertação - em contraste com o caminho do meio recomendado pelo budismo.




Monges jainas


Monges budistas

A VIDA MONÁSTICA

Uma característica em comum do budismo e do jainismo é a organização de ordens monásticas ou comunidades de monges. Renúncia e ascese são fundamentais para ambas as religiões como o principal meio para a libertação. Os monges vivem juntos em grupos e praticam a Consciência de acordo com um código de conduta estabelecido. Eles compartilham o trabalho da comunidade, como cozinhar e limpar em sistema de rodízio como um dever religioso e uma oportunidade de praticar a virtude. Normalmente, os monges mais velhos se encarregam dos assuntos da comunidade e mantem a ordem. Eles, também, compartilham seu conhecimentos e experiência com os monges mais jovens e novos iniciados, treinando-os rigidamente para práticas mais avançadas. O viverem todos num mesmo ambiente, o convívio, o compartilhamento de valores e crenças comuns cria vibrações fortes, eleva-os espiritualmente e ajuda-os em seu progresso.




CONCLUSÃO

O budismo e o jainismo tiveram origem  e se desenvolveram na mesma área geográfica que compreende  o atual Bihar e estados adjacentes, numa altura em que a religião védica intentava penetrar no vale do Ganges. A autoproclamada superioridade das classes sacerdotais da religião védica e suas tentativas petulantes  de excluir  muitas pessoas do estudo e práticas das escrituras provocaram uma forte reação entre muitos intelectuais  da época, especialmente, das classes dominantes das regiões que Gautama e Mahavira pertenciam. Isso levou a  uma agitação de ideias religiosas e o surgimento de uma série de tradições, ou seitas, rivais que disputavam entre si o apoio e companheirismo. Dessas, poucas sobreviveram. Apenas, o budismo e o jainismo foram capazes de manter sua distinção como  religiões separadas; as outras foram assimiladas pela religião védica transformando-se em seitas desta.


Houve um momento em que as duas religiões - budismo e jainismo - dominaram a cena religiosa da Índia, empurrando o seu rival em comum para um terceiro plano. Sob o patrocínio de Asoka* o budismo cruzou as fronteiras do subcontinente indiano e foi para o Nepal, China, Tibet, países do Extremo Oriente, na Ásia Central, Sri Lanka e no Japão, enquanto o jainismo permaneceu confinado a sua terra de origem. 


* Asoka - foi um imperador indiano da dinastia máuria (reinou entre 273 a.C. e 232 a.C.). Frequentemente é citado como um dos maiores imperadores da Índia. Asoka reinou sobre a maior parte do território correspondente a Índia moderna depois de várias conquistas militares. Seu império estendia-se do atual Paquistão, Afeganistão e partes do Irã, a oeste, até Bengala e os atuais estados indianos de aAssã, a leste e de Mysore, ao sul. Sua capital era Mágada (atualmete no estado indiano de Bihar). Ele converteu-se ao budismo abandonando a tradição védica predominante, depois de testemunhar os massacres da guerra de Kalinga, que ele mesmo havia iniciado devido a seu desejo de conquista. Dedicou-se, posteriormente, à propagação do budismo na Ásia e estabeleceu monumentos marcando diversos lugares significativos na vida de Gautama Buda.



No decorrer do tempo, ambas as religiões, também, sofreram cismas, resultando em movimentos sectários. Por muito tempo o budismo manteve sua postura definida contra o hinduísmo, enquanto que o jainismo manteve uma atitude mais cordial e tolerante, empregando sacerdotes brâmanes  para realizar rituais do templo, deixando suas crenças e práticas integrarem-se na tradição rival - como o conceito de ahimsa ou não-violência, o vegetarianismo, a transmigração das almas, a encarnação dos seres puros, o conceito de carma e maya e assim por diante. Comparativamente, o jainismo era menos popular do que o budismo. Seu conceito de carma faz da vida uma prova difícil para os fracos, para os insinceros e os de mentalidade mundana. Sua ênfase no ascetismo extremo e pureza interior desencorajam muitas pessoas  de se unir a ele. Curiosamente, no final, foi o budismo que declinou na Índia e foi dominado pelo hinduísmo. O jainismo, por outro lado, perdeu a maior parte de seus seguidores para ambos os rivais nos primeiros estágios de desenvolvimento religioso da Índia. Mas sobrevive até hoje como uma religião separada, mantido por um público, verdadeiramente, comprometido com sua doutrina.




Tirthankara Mahavira